Como falar de uma demissão por justa causa em uma entrevista de emprego?
A colunista Isis Borge orienta leitora que está sem confiança para buscar uma nova oportunidade após ser demitida de seu último cargo
Colunista da VocêRH e do Valor Econômico
“Depois de trabalhar dois anos em uma empresa que gostava muito, acabei sendo demitida. Porém, fui surpreendida por uma demissão por justa causa. Apenas me disseram que algumas pessoas do time que eu liderava se queixaram em relação à forma como eu me comunico, mas não deram muitos detalhes. Fiquei muito abalada e sem confiança para buscar outras oportunidades. Como lidar com isso e abordar esse assunto em futuras entrevistas?” Gerente de key account, 31 anos
Primeiramente, sinta-se acolhida com a minha resposta à sua pergunta sabendo que uma demissão não define quem você é e nem os seus passos futuros. A forma como você vai reagir a essa demissão é que pode te impulsionar ou te estagnar na jornada profissional.
O mercado tem mudado. É cada vez mais comum vermos situações em que, às vezes, uma forma de se comunicar pode ser mal interpretada e prejudicar a carreira de uma pessoa. No seu caso, podem ter sido diferentes situações que geraram o incômodo. Talvez, por exemplo, você seja objetiva e prática, mas é interpretada por alguns como mal-educada ou grossa.
Também já vi gestores informais demais na comunicação com os times e que acabam indo contra a política de diversidade e inclusão da empresa, muitas vezes, por simples desconhecimento do tema. Lembrando que existe uma série de expressões que não cabem mais no nosso vocabulário e precisam ser ajustadas para não termos discursos ofensivos. Às vezes, até um microgerenciamento excessivo pode causar estresse nas equipes e gerar desconfortos a ponto de fomentar uma denúncia.
Sem o antigo empregador te oferecer mais detalhes, é difícil ter certeza de qual pode ter sido o comportamento que não foi aceitável. Mas, com os exemplos citados, pode ser que você consiga avaliar melhor o que pode ter acontecido. Às vezes, até uma simples recomendação à equipe, que fuja de um processo padrão da empresa, pode levar à demissão.
Comunicação é uma habilidade difícil de dominarmos. O “tom do discurso” esperado de um colaborador varia muito de uma empresa para outra, muito guiado pela cultura da organização. Mas, no geral, o mercado de trabalho tem tentado evoluir para diálogos mais humanizados e inclusivos, cercado de segurança psicológica. Essa evolução pode ser um desafio para muitos líderes.
Dito isso, a primeira coisa que você deveria fazer é recapitular a sua passagem por essa organização e relembrar as interações com as pessoas da sua equipe. Tente identificar as situações em que a sua comunicação pode ter sido fora do aceitável para aquelas pessoas naquela cultura organizacional. Você pode ter deixado alguém desconfortável com algo que disse? Dificilmente alguém faz uma denúncia por um comportamento isolado. Até o liderado ter coragem de se posicionar, são necessários vários eventos.
Eu, primeiro, tentaria entender o comportamento que precisa ser trabalhado. A partir disso, buscaria ajuda para mudar o padrão de comportamento, seja com psicólogos, psiquiatras, psicanalistas ou, até mesmo, alguém da sua confiança que tenha uma boa vivência no mundo corporativo e possa atuar como um mentor ou um coach de carreira.
Também te recomendo conversar com pessoas que já trabalharam com você em outras empresas. Peça um feedback sincero sobre o seu padrão de comunicação. Não tenha medo de explorar o tema para entender se trata-se de um comportamento que já incomodou outras pessoas ou apenas foi evidenciado nessa última passagem profissional. Não mudamos de comportamento de um dia para o outro. Você vai precisar de tempo nessa jornada de autodescoberta. Mas saber o que precisa ser trabalhado é o primeiro passo.
Buscar conhecimentos adicionais sobre o assunto pode ajudar muito nessa trajetória de busca por mais autoconhecimento. Por exemplo, livros de comunicação não violenta ou aqueles voltados a questões de diversidade e inclusão são sempre boas recomendações. Vale a pena aprofundar o conhecimento nesses e em outros assuntos que exigem de nós bastante sutileza no trato com as pessoas.
Se, nessa análise, você avaliar que a demissão por justa causa foi injusta ou mal fundamentada, considere a possibilidade de consultar um profissional jurídico para avaliar o cenário, seus direitos e as opções legais. Isso pode te ajudar a encontrar um caminho para lidar melhor com as consequências da demissão.
Pensando em processos seletivos, quanto melhor você tiver digerido a situação, melhor será o seu desempenho na entrevista. Isso porque, nos bate-papos com empregadores e/ou recrutadores, mesmo que inconscientemente, evidenciamos muito o que estamos sentindo.
Ao abordar a demissão em entrevistas futuras, tenha um discurso transparente, equilibrado e leve. Evite criticar a empresa ou colegas. Concentre-se no fato e em como você evoluiu como pessoa e profissional com a experiência. Demonstre humildade ao reconhecer os pontos de melhoria e destaque as ações práticas para melhorar. Isso não é fraqueza. É maturidade.
E, por fim, fique bem. Esse fato não a impedirá de se recolocar. As demissões por justa causa são mais complicadas quando envolvem temas relacionados à desvios éticos, roubos e fraudes. Temas comportamentais voltados à comunicação, apesar de sensíveis, podem ser melhorados.
Todos nós temos pontos de melhoria e estamos sujeitos a errar em algum momento da vida e/ou da carreira. Se você demonstrar que assimilou o aprendizado da situação e está atuando para evoluir, juntamente com o entusiasmo e preparo para a entrevista, você terá boas chances de ser contratada. Te desejo sucesso nessa nova jornada.