No Brasil, 6 em cada 10 profissionais estão desengajados
Colunista da VocêRH e do Valor Econômico
Essa semana, participei do lançamento do Índice Engaja S/A, estudo desenvolvido em uma parceria da Flash Benefícios, do Talenses Group e da FGV – Fundação Getulio Vargas com o apoio do professor Paul FERREIRA e da professora Lilian Carvalho. Existem muitas pesquisas globais sobre o tema engajamento, mas não existiam iniciativas locais que retratem o Brasil, o que é um importante diferencial do nosso estudo.
A maior parte da literatura existente sobre engajamento foi produzida nos anos 80. Temos a escala Utrecht como um parâmetro de mapeamento, que segue válido hoje em dia, mas era importante produzir algo a mais, ampliar a reflexão sobre o grau de envolvimento dos profissionais com a empresa e as atividades que executam.
Sempre é possível, também, entender mais sobre os sentimentos dos profissionais com relação às empresas em que atuam em plataformas como a Glassdoor. Aliás, dando uma olhada por lá, é possível constatar que mais de 50% dos respondentes não recomendam suas organizações como um bom local para se trabalhar.
Como eu disse, era necessário ir além. Com essa ideia em mente, foi criado o Índice Engaja S/A para, basicamente, encontrar respostas para três questionamentos: “Qual é o nível de engajamento de colaboradores e executivos brasileiros atualmente?”; “Quais são os fatores que influenciam o engajamento dos colaboradores?”; e “Qual é a probabilidade de os trabalhadores brasileiros recomendarem seus empregadores no atual cenário de engajamento organizacional?”
Foram ouvidos 1.732 profissionais brasileiros empregados, entre líderes e liderados, sendo 60% homens e 40% mulheres. Nessa amostra, há representantes de todas as regiões do Brasil (49% do Sudeste, 18% do Nordeste, 18% do Sul, 8% do Centro-Oeste e 6% da região Norte). Com relação à etnia, temos 64% que se declaram brancos, 33% negros, 2% amarelos e 1% de outras etnias. Em termos geracionais, 5% são Baby Boomers, 33% pertencem à Geração X, 50% são Millenials e 12% são da Geração Z.
Compartilho a seguir algumas descobertas interessantes do estudo:
6 em cada 10 colaboradores estão desengajados
Na análise por nível hierárquico, é possível ver que 3 em cada 10 colaboradores estão engajados e 6 em cada 10 gestores apresentam engajamento. Essa diferença pode ser explicada por um fato: os líderes se mantêm mais próximos do centro do poder e participam da tomada de decisão, o que lhes dá mais clareza e segurança dos rumos do negócio. A alta liderança também tem autonomia para equilibrar as próprias demandas.
Profissionais desejam melhor remuneração e oportunidade de crescimento
Dos dez atributos de engajamento pior avaliados por colaboradores, cinco estão nas dimensões de remuneração e oportunidade de crescimento, sendo eles mobilidade interna, remuneração variável e bônus, capacitação e desenvolvimento, benefícios financeiros e salário adequado à posição.
Aqueles que atuam remotamente aparentam maior engajamento
Outro ponto que chamou a minha atenção foi o seguinte: profissionais que estão trabalhando remotamente têm um maior engajamento e avaliaram melhor o ambiente de trabalho, na comparação com aqueles que têm atuado no modelo presencial.
O pior índice de engajamento está no Sudeste do País
Em termos geográficos, o Sudeste teve o pior engajamento, se comparado às demais regiões do Pais. Esse cenário pode ser explicado pela seguinte realidade: trata-se de uma região em que o mercado de trabalho é mais dinâmico em termos de oportunidades, o que faz com que os profissionais sejam mais exigentes com relação a seus empregadores.
Profissionais das Gerações Z e Baby Boomers tendem a ser mais engajados
Outro ponto interessante é que o engajamento da Geração Z e dos Baby Boomers foi maior do que o das Gerações X, Y ou Millennials. Minha visão desse cenário é a seguinte: acredito que muitos respondentes dessa pesquisa que integram a Geração Baby Boomer estão no topo da pirâmide, com um ambiente de trabalho positivo, além de remuneração adequada, oportunidades de crescimento e mais conexão com o significado dos seus trabalhos. Já os da Geração Z, que acabaram de ingressar no mercado de trabalho e têm menor parâmetro comparativo, tendem a ser mais otimistas quanto às oportunidades de crescimento.
Mulheres anseiam por melhor remuneração e oportunidades de crescimento
De uma maneira geral, a questão de gênero não impactou no engajamento. Porém, é importante destacar que as mulheres se mostraram mais desengajadas quando o assunto foi remuneração e oportunidades de crescimento.
Ambiente de trabalho positivo contribui para o engajamento
Dos 10 atributos mais bem avaliados, a maioria está em dimensões motivacionais como ambiente de trabalho positivo e significado do trabalho. Já dentre os dez com pior avaliação a maior parte está em dimensões funcionais como remuneração e oportunidades de crescimento.
Liderança e significado do trabalho impactam o NPS
Na matemática de uma composição de NPS para mensurar o quanto um profissional indicaria a própria empresa para alguém trabalhar, os três fatores que impactam essa indicação são: confiança na liderança, boas práticas de gestão e significado do trabalho. É interessante notar que a remuneração não impacta no NPS, mas sim no desengajamento.
Engajamento tende a aumentar com o tempo
Um outro fator interessante mapeado pelo estudo é que o engajamento tende a aumentar com o tempo. Ao meu ver, isso faz todo o sentido. Afinal, leva-se tempo para criar confiança, como está bem detalhado no livro “The speed of trust” do Stephen Covey.
Muito mais do que dados, o Índice Engajamento S/A gera reflexões
No evento de lançamento do Índice Engaja S/A, estudo que pretendemos fazer anualmente, tivemos a participação da Edise Toreta, Head de Recursos Humanos da Merck Group para a América Latina, e da Joana Piedade D. Vecchia, diretora de Recursos Humanos e Head de Colleague Experience da Aon para a América Latina. Elas apresentaram diversos exemplos de boas práticas que podem ser adotadas pelas empresas. Sugeriram, por exemplo, a realização de pesquisas internas anônimas mais de uma vez por ano e apresentação de planos de ação aos colaboradores com base no mapeamento.
A Edise comentou, inclusive, sobre a importância de termos pequenos comitês de colaboradores participando nos diagnósticos e planos de ações dos itens que tiverem pior avaliação na pesquisa interna, com o cuidado de deixar os colaboradores informados sobre o que está sendo feito para melhorar o clima organizacional e as condições de trabalho.
Ela mencionou, também, algo que eu acredito muito: a importância de conversas individuais das lideranças com seus liderados visando explorar melhor o propósito de cada colaborador. Pois, o que me move é diferente do que pode mover você. E, com esse cuidado, é possível ter planos de ações individuais e maiores chances de aumentar o índice de satisfação e engajamento dos colaboradores.
Indicações de literaturas sobre engajamento
Para quem quiser aprender mais sobre engajamento, existem literaturas dos anos oitenta disponíveis. E, aos poucos, começamos a ter um material mais atualizado sobre o tema. O próprio professor Paul FERREIRA tem publicado no Brasil artigos muito interessantes. Com relação a fontes internacionais, vale pesquisar as literaturas de Adam Grant (autor de livros, como “Give and Take”, “Originals” e “Option B”), Simon Sinek (autor do livro “Start With Why”) e Josh Bersin (que escreveu o livro “The New Workforce”). Tem também a Amy Edmondson, que além de ser referência quando o assunto é segurança psicológica, lançou, recentemente, um livro interessante intitulado “Right Kind of Wrong: The Science of Failing Well”.
Agora, conta para mim: o que te motiva e te desmotiva no seu atual trabalho?
ISIS borge sangiovani
Colunista da VocêRH e do Valor Econômico