Reflexões sobre a maternidade no mercado de trabalho

Isis Borge Sangiovani
Managing Partner no Talenses Group & Executive Director na Talenses
Colunista da VocêRH e do Valor Econômico

Aproveito que estamos às vésperas do Dia das Mães para compartilhar um pouco do meu ponto de vista sobre como a maternidade tem sido percebida no mundo corporativo e como mães e futuras mães podem se posicionar diante de pessoas e situações desafiadoras sobre o tema durante processos seletivos.

Crenças equivocadas que dificultam o avanço da equidade de gênero

Inicio dizendo que a meta de equidade de gênero vem evoluindo nas empresas, mas a passos lentos. Quando olhamos um dado da pesquisa Panorama Mulheres, realizada pelo Talenses Group, vemos uma tímida melhora no percentual das profissionais em cargos de liderança.

Em 2023, a ocupação era a seguinte: mulheres ocupando 34% das vagas de vice-presidência, 26% em diretoria e 21% em conselhos. Em 2017, os índices registrados foram 18%, 21% e 10%, respectivamente.

Entendo que a disparidade se dá por diversos fatores, mas ao meu ver, certamente a maternidade está impactando negativamente esses números e vou explicar os porquês, com base no que ouço no meu dia a dia como recrutadora.

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Licença-maternidade é uma perda para a empresa

Muitas empresas ainda resistem a contratar mulheres alegando que precisarão arcar com déficits na equipe caso essa profissional venha a desfrutar de licença-maternidade. Em razão desse olhar de curtíssimo prazo, vejo, com alguma frequência, profissionais incríveis sendo descartadas de processos seletivos, sem uma justificativa pertinente.

Hoje, existem processos seletivos de vagas afirmativas para mulheres? Sim, mas, ainda, principalmente quando a liderança está sendo cobrada por mais equidade de gênero. Inclusive, em alguns casos, essas metas estão atreladas à bonificação do responsável pela vaga, ou seja, um incentivo forçado. Ainda assim, poucas empresas estão genuinamente empenhadas nessa missão.

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A mulher não será mais tão produtiva e focada

Infelizmente, ainda temos uma grande quantidade de mulheres que são dispensadas no retorno da licença-maternidade. Em alguns casos, inclusive, a demissão acontece na data do retorno da profissional, o que, ao meu ver, é uma atitude muito cruel. Afinal, muitas vezes, aquela mulher fez uma série de adaptações na vida pessoal para poder retornar ao trabalho.

São mulheres que, além da frustração de serem demitidas em um momento tão sensível da vida, ainda tendem a enfrentar muitas dificuldades para se recolocar. Elas sabem que são grandes as chances de encontrar muito preconceito pelo caminho até darem a sorte de se deparar com um ambiente corporativo de apoio e acolhimento.

O que posso compartilhar sobre a minha experiência como mãe e profissional

Sou mãe de três meninos. Quem me conhece sabe que sou uma profissional muito ativa e o que noto é que o nascimento de cada filho aumentou em mim a garra e o foco. Todos os dias me empenho para ser uma profissional e uma pessoa melhor tanto para inspirá-los quanto para manter meu emprego, que, de muitas formas, também os beneficia.

Esse não é apenas um cuidado que eu tenho. Muitas profissionais que também são mães, sejam as que entrevisto ou aquelas com as quais convivo no ambiente pessoal e profissional, compartilham desse meu pensamento. Ou seja, ao contratar mães, as empresas também têm a ganhar.

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Boas práticas das organizações ao contratar mulheres

Muitos dos preconceitos com relação ao tema mulheres e mercado de trabalho vêm de vieses inconscientes. Pensando nisso, compartilho a seguir algumas reflexões que podem ajudar a minimizar esse preconceito em processos seletivos: 

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Só faça perguntas que você faria para qualquer pessoa de qualquer gênero

Perguntas que, usualmente, só são feitas para mulheres devem ser extintas dos processos seletivos. Algumas delas, inclusive, têm potencial para gerar ações judiciais. Dessa forma, evite perguntas como:

●     Você é uma pessoa sensível no dia a dia, seja sob pressão ou quando recebe uma notícia ruim ou um feedback negativo sobre o seu trabalho?

●     Por que você não se casou? Por que você se divorciou? Por que você ainda não quis ter filhos?

●     Como você vai vir ao escritório ou trabalhar em home office tendo filhos?

●     Existe alguma possibilidade de você faltar se o seu filho ficar doente?

●     Como você consegue se posicionar no trabalho sendo mulher?

●     Você usa roupas muito chamativas ou decotadas no trabalho?

●     Quem vai ficar com os seus filhos para você trabalhar?

●     Quem leva e busca os seus filhos na escola?

●     Você tem um relacionamento estável?

●     Já namorou alguém do trabalho?

●     Você pode viajar tendo filhos?

●     Você pensa em ter filhos?

●     Você planeja se casar?

●     Qual é o seu signo? 

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Tenha como norte as habilidades e competências profissionais das mulheres

Uma entrevista de emprego deveria ser pautada no aspecto profissional de quem se candidata para a vaga. Se a pessoa sentir abertura, criar uma conexão com os entrevistadores e abrir algum ponto de sua vida pessoal, tudo bem. Afinal, a cultura brasileira é bem relacional. Mas as perguntas que citei acima precisam parar de ser feitas.

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Pense no longo prazo

A mesma mulher que se afasta da empresa para desfrutar da licença-maternidade ou que, vez ou outra, vai precisar levar o filho ao médico ou acompanhá-lo em uma atividade da escola pode ser aquela que terá sempre o serviço em ordem. Ela entende que a vida dela é suscetível a mais imprevistos, na comparação com quem não tem filhos.

Então, em vez de rejeitar quem quer ser mãe, quem está grávida ou quem já tem uma criança, busque entender melhor quais têm sido as razões e os benefícios das empresas que têm contratado e promovido gestantes. Talvez, o que te falte para acolher melhor as mulheres seja apenas ampliar a perspectiva sobre o tema.

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Perguntas que profissionais que são mães sempre me fazem

Sabemos que uma vaga de trabalho, muitas vezes, é conquistada nos detalhes. Nesse cenário, frequentemente, sou abordada por candidatos com as mais diferentes dúvidas. Com relação às mães, em geral, quatro perguntas são as que mais respondo:

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Devo colocar no currículo que tenho filhos?

O que eu recomendo: O currículo é um documento em que devem estar explícitas suas habilidades técnicas e comportamentais que te qualificam a ingressar e/ou permanecer no mercado de trabalho. Informações pessoais, como estado civil ou nome e número de filhos são totalmente opcionais. Se você notar, verá, por exemplo, que, hoje, nas diferentes redes sociais, inclusive no LinkedIn, muitas pessoas mencionam os nomes dos filhos antes mesmo dos demais papeis que exercem na vida.

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Como citar no currículo o período em que fiquei afastada do mercado?

O que eu recomendo: Uma forma elegante é mencionar o período de afastamento ao lado da frase “Pausa na carreira em função da maternidade”. Essa informação deve estar disposta no campo “experiência profissional”, seguindo a ordem cronológica.

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Como devo reagir diante de perguntas constrangedoras?

O que eu recomendo: Responder ou não é uma escolha individual. Caso opte por não responder, você pode, de uma forma educada, dizer que não vê relevância naquela pergunta para o processo seletivo. É claro que, com essa atitude, existe a real chance de você ser desconsiderada do processo. Mas será que vale a pena trabalhar em uma empresa que já inicia a relação de trabalho demonstrando algum tipo de preconceito?

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Devo citar no Linkedin que sou mãe ou pai?

O que eu recomendo: Eu tenho visto com bons olhos essa humanização aqui na rede. Noto que as pessoas costumam se conectar melhor com quem é autêntico e ousa sair da extrema formalidade. Muitas pessoas colocam, inclusive, o nome dos filhos, o que costuma criar uma conexão mais genuína com quem, também, valoriza a família. Mas é algo totalmente opcional.

Uma realidade difícil de acreditar

Já ouvi relatos de mulheres que, ao descobrirem a gravidez, em vez de, primeiramente, reagirem com felicidade, entraram em verdadeiro pânico por receio da reação do empregador. Outras, que enfrentaram aborto espontâneo, algo muito comum de acontecer, optaram por sofrer em silêncio por não se sentirem acolhidas e respeitadas no ambiente de trabalho.

Antes de rejeitar, procure entender

Minha intenção com essa newsletter é fortalecer o grupo de pessoas que acreditam no poder e na contribuição das mães no mercado de trabalho. Mas, também, é um convite para que aqueles mais céticos pensem melhor a respeito do tema, busquem ler e ouvir sobre os meios, a importância e os benefícios de fazer parte desse movimento.

Se você é mãe, desejo que o seu próximo domingo seja de muitas comemorações. Se você conhece uma mãe que merece parabéns pelos cuidados com uma criança, não deixe de demonstrar o quanto as ações dela são especiais.

 
ISIS borge sangiovani
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